domingo, 18 de dezembro de 2016

O SENTIDO DE PERTENÇA

Vivemos em cadeia

Há pouco tempo, dei comigo a pensar no lugar que cada um de nós ocupa nesta existência terrestre de que tanto gostamos, dizem uns, e de que outros se queixam tanto. Até se atribuem culpas a Deus pelas mais turbulentas situações, desde a miséria, a doença, o sofrimento das crianças, a morte, etc.
Sou daqueles que não sou capaz de dizer, perante uma morte, que “foi Deus que o levou”, porque eu não tenho de Deus a ideia de coveiro, de bombeiro, de facilitador do bem para uns e amaldiçoador de outros. A nossa natureza de mortais, sujeitos à condição de passagem contingente por aqui, carregados de falibilidades, e muitas delas dependentes de nós próprios (o nosso estilo de vida, as relações sociais, os hábitos alimentares…), para mim são justificações mais reais daquilo que nos acontece.
E como me situo eu perante as adversidades? Aqui, sigo um pouco a teoria de Piaget, que fala de assimilação e acomodação no processo de crescimento da pessoa, em vista do que ele chama a equilibração. Na prática, procuro assimilar o acontecimento com alguma distância, digerir o seu valor real na minha vida, compreender o seu significado. Depois, tento acomodar-me, sempre com sofrimento ou algum sacrifício, envolvendo-me com as circunstâncias para melhorar a minha compreensão e sentido de vida. 
Se o meu conhecimento cresce, as minhas acções e opções de vida também se vão alterando. Falo de ciência? Não, falo de mais do que de ciência. Falo dum sentir interior global que me dá a percepção do mundo vasto e grandioso que nos rodeia e vive em cada um e que a ciência não consegue explicar (o amor, a energia psicológica, a beleza, a religião).
Vida sempre em renovação...
Perante a morte, há muito que sei que sou um pó, uma areia do universo, ou melhor, um elo de uma cadeia sem fim, que vem de geração em geração, não só no sentido biológico, mas também na esfera do conhecimento, do saber e sentir espiritual, que me dá a noção de pertença a uma humanidade que evolui e se enriquece. Em vez de me isolar, sinto-me unido aos outros, imaginando-me integrado num movimento ascendente de uma humanidade a caminho da perfeição no amor, na justiça, na equilibração total. Ajudar alguém a crescer, a ver melhor a situação numa aula ou num encontro dá cá um sabor interior tão luminoso!...
Em cadeia e em sentido ascendente...
Até mesmo a minha fé só se explica nesta união ao grupo, à comunidade, à multidão dos que aderem a um Cristo-Deus na história, coexistindo com o mal, a ignorância, a doença, mas tentando melhorar as coisas… Posso não ser muito bom cristão, mas este sentido de pertença ao grupo dos crentes não se esvai, está cada vez mais vivo e alegra-me. Se calhar, para mim é mais fácil falar de Deus do que falar com Deus! Mas esta noção de que pertenço ao grupo já me ilumina os passos.

Teilhard du Chardin falava do sentido ascendente de todo o universo para a divinização (“Le milieu divin”), melhor dito, para a cristificação.  É por aí que eu também gosto de reflectir. 

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