De vez em quando, surge o inesperado nos nossos dias. E eles enchem-se de uma energia que nos arrasta para momentos especiais, pegando em nós e levando-nos para longe em busca de um prazer espiritual inusitado.
Aconteceu há pouco. Por influência
dos filhos, soubemos de duas exposições de arte do amigo Nelson Ferreira, uma
no Museu Nacional de Arte Contemporânea-MNAC- (31/07) e outra no espaço das
Capelas Imperfeitas, mosteiro da Batalha (01/08). E como a história do Nelson se
mistura em parte com a dos nossos filhos, desde os bancos da Escola
Preparatória Paulo da Gama, sentimos que não podíamos ficar em casa e uma mola
nos empurrava. Ia valer a pena…
Essa mesma mola me obriga a escrever,
pois eu ficaria incomodado se não publicitasse a beleza daqueles dias, a
alegria do encontro com o artista e seus convidados e ainda com a arte que ele
expõe com simplicidade, mas que nós sabemos ser fruto de uma carreira dura,
longa, muito esforçada e já cheia de sucesso, mormente em Inglaterra, onde há
muitos anos ele se radicou em busca de conhecimento e reconhecimento. E, na
verdade, ele é hoje reconhecido pelos melhores meios artísticos, sendo
solicitado por instâncias e universidades de toda a parte a dar aulas e a
apresentar cursos pela internet.
E que vimos nós nestas duas exposições?
Em Lisboa, o artista, convidado para
uma residência artística no MNAC, pegou em três esculturas e executou um
conjunto de aguarelas apenas em azul, em que ele embrulha as estátuas nuas e
frias com filtros nebulosos em várias tonalidades. E ficamos a olhar para
aquelas transparências a imaginar a vida, o mistério, o abraço ao outro…
Aquela parede ao sol estava aquecida pelos quadros azuis do artista e mais quente ficou com a atuação de Cátia Alhandra, uma voz com tonalidades árabes e mediterrâneas, acompanhada pela viola de outro artista, Tiago Valentim, músico erudito que tem acompanhado outros artistas.
No mosteiro da Batalha, uma exposição bem diferente. O artista embrenha-se pela história, vai ter com novas culturas, que ele frequentou à procura de outras técnicas e executa um conjunto de ícones bizantinos que nos deixam suspensos a olhar sem entender tudo. É uma incursão pela antiguidade oriental, o fazer como os artistas faziam, sem instintos individualistas, querendo sobretudo projetar-nos para o mundo do mistério, respeitando o simbolismo das formas, que se repetem, mas que apelam mais à meditação do que à atenção por uma escrita figurativa. O artista quase que esquece a sua individualidade e coloca-se ao lado dos outros artistas, apenas a seguir uma tradição milenar. Para ser perfeito, correu mundo, frequentou mestres e foi fiel ao seu querer iniciar-se em outros ambientes da arte. Mas o nosso olhar fica preso àqueles pequenos quadros, diferentes entre si, mas todos apelativos.
Também aqui a exposição foi abrilhantada pelos mesmos artistas, Cátia Alhandra e Tiago Valentim, com uma música bem espiritual a ecoar nas voltas e arcadas das belas e perfeitas (!!!) Capelas Imperfeitas.
A pandemia empurrou-nos para dentro de casa. Mas agora temos de nos abrir ao exterior para degustar as coisas boas que por aí esperam por nós. E estas incursões culturais foram muito agradáveis.
Exposições a visitar até 30 de Outubro.
António Henriques