terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

A VERDADE


Há verdades alternativas?
Que melhor aconchego para os ninhos das gaivotas?

Tenho andado há uns tempos intrigado com o que ouço e leio acerca dos sistemas de comunicação entre pessoas e países, que parece que, em vez de nos transmitirem o que aconteceu de verdade, nos impingem modos de ver “alternativos” a que chamam também “a verdade” e nos deixam sem saber em quem e em quê acreditar.

Eu sei que as emoções influenciam o nosso pensamento, segundo António Damásio, e que os nossos modos de pensar não são tão assépticos como gostaríamos que fossem. É mais fácil acreditar naquilo de que gostamos do que no inverso. Mas, mesmo assim, ainda pensava que as ideias podiam circular sem estarem viciadas por interesses ou conveniências.

Fala-se assim na era da pós-verdade, um chavão que contém muita perversidade. Há muitos anos já, habituei-me a verificar que até a matemática não é exacta em política, isto é, os números são interpretados de modos tão contraditórios que não dá para imaginar até onde pode ir a imaginação humana. O mesmo acontece noutros campos sociais, por ex. no desporto, em que os programas dos comentadores desportivos mostram bem como as imagens são interpretadas de acordo com os gostos clubistas, o que já me fez arrefecer bastante aquela sensação de pertença a um clube, dadas as muitas falcatruas que andam misturadas com o verdadeiro desporto.

Eu não queria afastar-me muito do essencial, para mim muito confuso e doloroso, que é dizer, como há dias escrevia um amigo meu: “nos tempos da pós – verdade, podemos afirmar, cada vez com mais certeza, que a verdade se transmuta consoante o interesse do emissor”. E assim, volta outra vez a pergunta de Pilatos a Jesus Cristo: «o que é a verdade?»

Das minhas leituras fez parte há uns meses o bem conhecido filósofo Edgar Morin e o seu livro: “As grandes questões do nosso tempo” (Edit. Notícias). Também ele nos repete: «Os nossos sistemas mentais filtram a informação: ignoramos, censuramos, repudiamos e desintegramos o que não queremos saber… Quase poderia formular esta lei psicossocial: uma convicção bem firme destrói a informação que a desmente». Ele chega a afirmar que a ideologia “é um sistema de ideias feito para controlar, acolher e recusar a informação. Se a ideologia é teoria, está em princípio aberta à informação não conforme, que a pode pôr em causa. Se é doutrina, está em princípio fechada a qualquer informação não conforme. A ideologia política é muito mais doutrina que teoria»(pág. 30).

Vigilância em companhia, a melhor solução.
Para mantermos a nossa imensa liberdade de espírito, temos de nos precaver seriamente contra estas correntes fortes de informação que nos empurram cegamente para modos de pensar balofos, com o título de modernos e arejados. Só conheço um modo de resistir a erros graves: é aceder a informações diversas, ler sobre os dois lados da questão. Isto pode ajudar a chegar à verdade, manter a independência e recusar seriamente a pós-verdade, um estado de espírito para mim desumano, inconveniente e castrador.

António Henriques 

Livre para voar, seguro para aterrar, forte para lutar. 

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